Estaciono o carro, olho para o horizonte e com sorte consigo ver umas linhas, se forem consistentes sei que vou surfar. Sinto uma adrenalina nas veias misturada com um frio nervoso que me obriga a encher o peito de ar. Visto o fato, aqueço o corpo, rezo e remo por entre as ondas geladas até ao outside. Lá fora, em segurança, os ombros latejam e o coração salta por todos os lados, respiro fundo, acerto o corpo com o farol, confirmo o posicionamento com uma rocha em forma de cogumelo e volto a respirar. Procuro para lá das linhas a minha viagem, quero a última. O vento sopra cortante e a corrente sorve as forças, durante minutos tento manter a posição, os braços pesam toneladas, cada remada é um passo para trás, entro na zona proibida, o 7 está a chegar. Engulo o coração e cerro os dentes, baixo a cabeça, fecho os olhos, penso na família e remo. Estou roto. Vais levar com o 7? Grito para dentro, rema… REMA. As cinco primeiras passam lentamente em silêncio. A sexta sobe mais que as anteriores, não faz ruído, mantenho olhos fechados, falta uma. Continuo a remar, os braços estão em fogo, não posso parar. Faço um derradeiro esforço e tento manter o ritmo. Ainda estou a remar? Não sinto o coração! Que raio. Abre os olhos. Um manto liso a perder de vista num minúsculo petroleiro junto ao horizonte e algumas gaivotas, remei de mais? Farol? Cogumelo? Não, estou no sítio certo, consegui. Mas onde está a última onda? Um vento suave sopra, as gaivotas levantam e o barco desaparece. O horizonte é engolido lentamente por uma montanha de água. Viro a prancha para terra e volto a remar com uma força heróica que não me pertence, o corpo arqueia e as pernas batem em consequência dum movimento frenético quase descontrolado dos braços, solto um rugido involuntário e fico de pé. A prancha avança dentro de um precipício translúcido por onde o Sol trespassa revelando uma quantidade infinita de cores. Estico o braço e por entre os dedos sinto a parede de água a passar, deslizo, agora seguro, acompanhado de peixes e de um som ensurdecedor. Perdido nos movimentos sou invadido por uma liberdade absoluta, perco a noção do tempo e acabo a viagem na areia, glorioso olho para o horizonte, e penso: mais uma?
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